sexta-feira, 6 de junho de 2008

QUINZE ANOS

Machado de Assis - Crisálidas

Oh! la fleur de l'Eden, pourquoi l'as-tu fannée,
Insoluciant enfant, belle Ève aux blonds cheveux!
Alfred de Musset

ERA UMA pobre criança ...
—Pobre criança, se o eras! —
Entre as quinze primaveras
De sua vida cansada
Nem uma flor de esperança
Abria a medo. Eram rosas
Que a douda da esperdiçada
Tão festivas, tão formosas,
Desfolhava pelo chão.
— Pobre criança, se o eras! —
Os carinhos mal gozados
Eram por todos comprados,
Que os afetos de sua alma
Havia-os levado à feira,
Onde vendera sem pena
Até a ilusão primeira
Do seu doudo coração!
Pouco antes, a candura,
Coas brancas asas abertas,
Em um berço de ventura
A crianca acalentava
Na santa paz do Senhor;
Para acordá-la era cedo.
E a pobre ainda dormia
Naquele mudo segredo
Que só abre o seio um dia
Para dar entrada a amor.

Mas, por teu mal, acordaste!
Junto do berço passou-te
A festiva melodia
Da sedução ... e acordou-te
Colhendo as límpidas asas,
O anjo que te velava
Nas mãos trêmulas e frias
Fechou o rosto... chorava!

Tu, na sede dos amores,
Colheste todas as flores
Que nas orlas do caminho
Foste encontrando ao passar;
Por elas, um só espinho
Não te feriu... vais andando...
Corre, criança, até quando
Fores forçada a parar!

Então, desflorada a alma
De tanta ilusão, perdida
Aquela primeira calma
Do teu sono de pureza;
Esfolhadas, uma a uma
Essas rosas de beleza
Que se esvaem como a escuma
Que a vaga cospe na praia
E que por si se desfaz;

Então quando nos teus olhos
Uma lágrima buscares,
E secos, secos de febre,
Uma só não encontrares
Das que em meio das angústias
São um consolo e uma paz;

Então, quando o frio 'spectro
Do abandono e da penúria
Vier aos teus sofrimentos
Juntar a última injúria:
E que não vires ao lado
Um rosto, um olhar amigo,
Daqueles que são agora
Os desvelados contigo;

Criança, verás o engano
E o erro dos sonhos teus-
E dirás, - então já tarde, -
Que por tais gozos não vale
Deixar os braços de Deus.

Nenhum comentário: